quinta-feira, outubro 14, 2004

UMA PEQUENA NAÇÃO, III

Depois da agitação provocada pelo insuportável Professor e do esforço orçamental que fora obrigado a fazer para levantar a moral do povo, o Chefe chegou ao Palácio convencido de que o pior havia passado. Sentou-se no sofá, serviram-lhe um wisky velho e pegou numa revista. Ao começar a ler ficou estarrecido. O prémio Nobel de Economia acabava de ser atribuido a dois Professores, de nome Finn Kydland, da Noruega, e Edward Prescott, dos Estados Unidos, pela sua teoria de “... inconsistência temporal aplicada à política económica, segundo a qual, em determinadas circunstâncias, é preferível a existência de regras de longo prazo, uma vez que há a propensão para os orçamentos anuais dos Estados serem usados para ciclos eleitoralistas...”
O Chefe gritou de raiva. Era demais. Não lhe bastava um Professor, nem dois. Agora eram três. E laureados pela Academia Sueca.
Mas que mal fizera, para esta perseguição ...
Mas os seus assessores e assessoras intervieram prontamente lembrando-lhe que os portugueses só se preocupavam com a sua pequena economia doméstica do dia a dia (como evitar dívidas com os seus orçamentos de € 500,00) e que essa preocupação já fora tratada para 2005 com as generosas benesses que o génio do Chefe tornara possível.
As questões macro-económicas era um jogo divertido, mas que só interessavam alguns fanáticos, sem influência eleitoral.
...........
(lamenta-se a não continuação destas notas, mas houve pressões no sentido de deixar o Chefe sossegado)

terça-feira, outubro 12, 2004

UMA NAÇÃO PEQUENA, II

O programa do Ministro não chegou a ser aplicado ao Professor porque este, depois de falar com o cunhado, que conhecia bem o e-government, resolveu desaparecer, sem alegar pressões ou outras maldades que eram sempre possíveis.
E, assim, a confusão instalou-se naquele País demasiado pequeno para tamanho imbróglio.
Todos falaram ao mesmo tempo.
No meio de toda a algazarra, foi grande a surpresa, quando se começou a perceber que estavam todos de acordo com tudo. Isto é: a liberdade de expressão é o máximo; não podem existir pressões sobre ao jornalistas, para não lhes criar stress, o País vive em liberdade total, etc., etc....
Acalmados os ânimos, o Chefe foi novamente à televisão para tomar mais umas decisões. Anunciou então algumas boas novas. Graças a si e aos seus colegas de equipa (os titulares e os que estavam no banco) o País já não estava de tanga, mas com os cofres cheios. Assim, ia poder cumprir as suas promessas: aumentar os salários e as reformas e baixar os impostos, sem aumentar o défice.
Parecia um milagre, que ninguém compreendia. Até os mais reputados economistas, conhecidos por saberem bem fazer contas, não encontraram a fonte de tanta abundância.
Talvez, admitiu um, se vendam algumas jóias. Ou se vá ao mealheiro dos filhos...
Entretanto, o Chefe regressou ao palácio, satisfeito consigo próprio, pois controlava a situação, que continuava estável. E isso era o que ele mais desejava.
(novo intervalo, antes de novas aventuras na nação pequena)

segunda-feira, outubro 11, 2004

UMA PEQUENA NAÇÃO

Numa pequena nação do terceiro mundo o Governo foi confiado a um grupo de pessoas interessadas em exercer o poder.
Alegaram que pretendiam trabalhar pelo País, modernizando as suas estruturas, diminuindo os impostos e lutando pelo progresso e o bem estar geral. Os sacrifícios seriam grandes, mas compensadores (claro que não foi explicado que os sacrifícios seriam do povo e as compensações para os sacrificados governantes)
A comunicação social passava as mensagens.
O povo via e ouvia, embevecido e esperançado.
Em frente às câmaras de televisão, o Chefe tomou as primeiras medidas, aparentemente por inspiração divina: os ministros iriam governar junto das populações, para governarem melhor....
Ninguém percebeu como isso seria possível, uma vez que, sendo muitos os problemas, havia muitos e pesados dossiers, que seria preciso transportar, e havia também muitos funcionários que teriam de ter muita mobilidade, coisa a que não estavam habituados.
Logo o chefe explicou que iria também criar o e-government, uma técnica de governo nova, que funcionava na internet.
O espanto foi geral. Finalmente o País tinha um chefe com novas ideias e novas técnicas e, graças a elas, iria aumentar, sem esforço, a sua baixa produtividade, que era muito criticada no estrangeiro.
Claro que foi preciso nomear muitos novos funcionários da confiança do Chefe, incluindo uma bonita adjunta para a comunicação social. Claro que foi necessário controlar algumas instituições, empresas e pessoas, que, por pura maldade, poderiam exercer uma acção nefasta.
Mas tudo era bem explicado na televisão pelo Chefe com o seu sorriso charmoso, que já seduzira muitas donzelas e agora seduzia a população, sem descriminação de sexos.
Mas persistia uma contrariedade. Um Professor, moreno e bem parecido, que também ia à televisão e que em tempos fora seu rival e agora se divertia a dizer mal de tudo. E dizia muito mal, durante muito tempo, porque dormia pouco e passava as noites a congeminar as suas maldades.
Realmente o Mundo não é perfeito e aquele pequeno País também não.
A última grande decisão do Chefe, de decretar um dia de descanso extra para toda população, decisão que foi naturalmente considerada como sábia e justa, foi mal aceite pelo Professor, que gosta de trabalhar muito e, por inveja, quer que todos façam o mesmo.
........
Então, um Ministro, que infelizmente não se tinha deslocado para junto do povo, foi à televisão dizer que o Professor era um grande malandro, que odiava o Chefe e lhe queria mal e que por isso devia ser amordaçado e, se possível, reeducado por uma Alta Autoridade.
.......(pequeno intervalo para publicidade).